MATRYOSKHA
Francisca Carvalho
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Ana Santos apresenta nesta exposição algumas peças que surpreendem pelo tom, escala, liberdade e precisão no uso dos materiais organizados a partir de um eixo vertical.
A lógica de construção em cada uma delas ecoa com a tradição do haiku Japonês que traz as palavras à presença física de uma vibração. Ana Santos atende à razão dos materiais eles próprios e manipula-os até acertar. Nem mais nem menos. O modo de juntar, sobrepor, cortar, torcer, transforma a colagem em subtracção. A operação é varrer enquanto cose-cozinha os pequenos acidentes. O varrimento vem depois de uma atenção demorada fazendo o espaço em volta acontecer à justa. Trata-se de chegar à vibração certa.
Como acertar? Fazendo coincidir velocidades diferentes.
Subtrair é a operação decisiva que vem sempre depois, quase no fim da peça acabada. Subtrair torna-se uma maneira de fazer respirar. É momento de suspensão e, por isso, decisivo. É preciso que os materiais encontrem a sua estabilidade interna. Nunca sabemos qual é antes de começar.
PVC, fios de nylon, bronze, ferro, chumbo, purpurina, parasol, fitas, motor giratório, parafina, purpurina, calcário, cola, colante, vidro, plástico, mangueira, tubo, penas e a lista continua.
Como faze-los confluir? A simples colocação dos objectos no espaço, dá-nos pistas para prosseguir. O olho que está aqui em causa reconhece, escolhe e incide como um laser sobre esta ou aquela junção, este e aquele intervalo entre duas coisas. Texturas, tecidos – os nervos de qualquer matéria – são tomados como cachos, por parcelas ou famílias e depois encostados à parede ou dispostos no chão. É preciso atender à posição certa antes de tudo. Pôr, dispor, sobrepor, contrapor: tudo maneiras de propor equilíbrios que se aguentam. Daí a elegância. Aguentam-se, com precisão, na escala do possível flexível.
Há nestas propostas (chamemos-lhes assim por enquanto) uma naturalidade alienígena.
De onde vem ela? Vem de reconhecer um princípio de acção em cada matéria usada, isto é – atender ao timbre dos materiais eles próprios. São quase todos pré fabricados, torcidos até chegarem por inteiro à sua natureza estranha. E não esquecer o Duns Escoto ‘a natureza é sempre curva’ – começa-se numa ponta e não se acaba na outra. Gira-se à volta de cada peça, volta-se lá, aos pequenos detalhes, ajeita-se aqui, tira-se dali. A atenção sempre em círculos a concentrar. Matryoshka-Matriz. O eixo vertical segura os ritmos circulares:
· É o caso de um tubo de pvc a furar um banco metálico paralelo à anilha na cintura do tubo, rodeando uma cortina redonda de fios compridos amarelados que caem da boca tubular quase até ao chão.
· Ou dois parassóis pretos translúcidos giratórios que rodam paralelos muito próximos um do outro à distancia de dois dedos, presos por um fio fitado que continua quase até ao chão.
A delicadeza que vem da acuidade das combinatórias deve-se ao apuramento do método que é frio e quente. Implica uma entrega à tarefa que só um pragmatismo devaneante consegue. Envolve cozimento e costura, rapidez na captura dos acidentes que ficam, limpeza e varrimento para perseguir os acasos certos. Abertura – porque a natureza é sempre curva e não se sabe quando nos vai apanhar.
have you come
to save us haiku poets?
red dragonfly
Kobayashi Issa
MATRYOSKHA
Francisca Carvalho
In this exhibition Ana Santos presents several works that surprise us in terms of their tone, scale and freedom and her precise use of materials organized around a vertical axis.
The construction logic underpinning each work echoes the tradition of Japanese haiku poetry - that brings the physical presence of a vibration to the words. Ana Santos pays attention to the underlying rationale of each material she uses and manipulates it until hitting the right note. Nothing more, nothing less. The means of joining, overlapping, cutting, twisting, transforming the collage into a subtraction. The operation is based on sweeping, while sewing/cooking together small accidents. The sweeping action occurs after painstaking attention, thereby ensuring that the surrounding space is just right. It’s about creating the right vibration.
How to get it right? Ensuring that different speeds coincide.
Subtraction is the decisive operation that always occurs at a later stage, almost at the end of the finished work. Subtracting becomes a way to breathe. It’s a moment of suspension and is therefore decisive. The materials need to encounter their internal stability. We never know what this is before we begin.
PVC, nylon threads, brass, iron, lead, parasol, ribbons, spinning motor, paraffin, glitter, limestone, glue, adhesive, glass, plastic, hose, tube, feathers…the list goes on.
How can we make them all converge? The simple placement of the objects in space offers us some clues to continue. In this case the eye recognizes, chooses and pinpoints this or that junction, this or that gap between two objects. Textures, fabrics - the nerves of any material - are taken as bunches, by batches, or families, and then propped against the wall or arranged on the floor. Above all it’s necessary to find the right position. Place, dispose, overlap, counterpoise: different ways of proposing durable balances. The elegance lies therein. They hold together, with precision, in the scale of the flexible possible.
These proposals (let's call them “proposals” for the time being) harbor an alien naturalness.
Where does this alien naturalness come from? It derives from the recognition of a principle of action in each material used, i.e. – paying attention to the timbre of each individual material. They are almost all pre-fabricated, and twisted until they fulfil their strange nature. And don’t forget Duns Scotus’ theory that “nature is always curved“ – it starts at one end and doesn’t end at the other. The artist revolved around each work, returned to it, paying attention to tiny details, adjusting here, trimming over there. Attention dedicated in concentrating circles. Matryoshka-Matrix. The vertical axis secures the circular rhythms:
· For example, a PVC tube which pierces a metal bench, parallel to the washer, in the middle of the tube, surrounding a round curtain of long yellowish strands which hang from the mouth of the tube and almost touch the floor.
· Or two black twirling translucent parasols that spin parallel to one another, about two inches from each other, held together by a taped thread that almost touches the ground.
The delicacy that derives from the acuity of these combinations is due to the fine-tuned precision of this hot-and-cold method. It implies complete dedication to a task that can only be achieved through visionary pragmatism. It involves cooking and sewing, quickly catching long-lasting accidents, cleaning and sweeping to pursue the right random occurrences. An open outlook - because nature is always curved and we don’t know when it will catch us.
have you come
to save us haiku poets?
red dragonfly
Kobayashi Issa
MATRYOSKHA
Francisca Carvalho
Ana Santos apresenta nesta exposição algumas peças que surpreendem pelo tom, escala, liberdade e precisão no uso dos materiais organizados a partir de um eixo vertical.
A lógica de construção em cada uma delas ecoa com a tradição do haiku Japonês que traz as palavras à presença física de uma vibração. Ana Santos atende à razão dos materiais eles próprios e manipula-os até acertar. Nem mais nem menos. O modo de juntar, sobrepor, cortar, torcer, transforma a colagem em subtracção. A operação é varrer enquanto cose-cozinha os pequenos acidentes. O varrimento vem depois de uma atenção demorada fazendo o espaço em volta acontecer à justa. Trata-se de chegar à vibração certa.
Como acertar? Fazendo coincidir velocidades diferentes.
Subtrair é a operação decisiva que vem sempre depois, quase no fim da peça acabada. Subtrair torna-se uma maneira de fazer respirar. É momento de suspensão e, por isso, decisivo. É preciso que os materiais encontrem a sua estabilidade interna. Nunca sabemos qual é antes de começar.
PVC, fios de nylon, bronze, ferro, chumbo, purpurina, parasol, fitas, motor giratório, parafina, purpurina, calcário, cola, colante, vidro, plástico, mangueira, tubo, penas e a lista continua.
Como faze-los confluir? A simples colocação dos objectos no espaço, dá-nos pistas para prosseguir. O olho que está aqui em causa reconhece, escolhe e incide como um laser sobre esta ou aquela junção, este e aquele intervalo entre duas coisas. Texturas, tecidos – os nervos de qualquer matéria – são tomados como cachos, por parcelas ou famílias e depois encostados à parede ou dispostos no chão. É preciso atender à posição certa antes de tudo. Pôr, dispor, sobrepor, contrapor: tudo maneiras de propor equilíbrios que se aguentam. Daí a elegância. Aguentam-se, com precisão, na escala do possível flexível.
Há nestas propostas (chamemos-lhes assim por enquanto) uma naturalidade alienígena.
De onde vem ela? Vem de reconhecer um princípio de acção em cada matéria usada, isto é – atender ao timbre dos materiais eles próprios. São quase todos pré fabricados, torcidos até chegarem por inteiro à sua natureza estranha. E não esquecer o Duns Escoto ‘a natureza é sempre curva’ – começa-se numa ponta e não se acaba na outra. Gira-se à volta de cada peça, volta-se lá, aos pequenos detalhes, ajeita-se aqui, tira-se dali. A atenção sempre em círculos a concentrar. Matryoshka-Matriz. O eixo vertical segura os ritmos circulares:
· É o caso de um tubo de pvc a furar um banco metálico paralelo à anilha na cintura do tubo, rodeando uma cortina redonda de fios compridos amarelados que caem da boca tubular quase até ao chão.
· Ou dois parassóis pretos translúcidos giratórios que rodam paralelos muito próximos um do outro à distancia de dois dedos, presos por um fio fitado que continua quase até ao chão.
A delicadeza que vem da acuidade das combinatórias deve-se ao apuramento do método que é frio e quente. Implica uma entrega à tarefa que só um pragmatismo devaneante consegue. Envolve cozimento e costura, rapidez na captura dos acidentes que ficam, limpeza e varrimento para perseguir os acasos certos. Abertura – porque a natureza é sempre curva e não se sabe quando nos vai apanhar.
have you come
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red dragonfly
Kobayashi Issa
⇑
MATRYOSKHA
Francisca Carvalho
In this exhibition Ana Santos presents several works that surprise us in terms of their tone, scale and freedom and her precise use of materials organized around a vertical axis.
The construction logic underpinning each work echoes the tradition of Japanese haiku poetry - that brings the physical presence of a vibration to the words. Ana Santos pays attention to the underlying rationale of each material she uses and manipulates it until hitting the right note. Nothing more, nothing less. The means of joining, overlapping, cutting, twisting, transforming the collage into a subtraction. The operation is based on sweeping, while sewing/cooking together small accidents. The sweeping action occurs after painstaking attention, thereby ensuring that the surrounding space is just right. It’s about creating the right vibration.
How to get it right? Ensuring that different speeds coincide.
Subtraction is the decisive operation that always occurs at a later stage, almost at the end of the finished work. Subtracting becomes a way to breathe. It’s a moment of suspension and is therefore decisive. The materials need to encounter their internal stability. We never know what this is before we begin.
PVC, nylon threads, brass, iron, lead, parasol, ribbons, spinning motor, paraffin, glitter, limestone, glue, adhesive, glass, plastic, hose, tube, feathers…the list goes on.
How can we make them all converge? The simple placement of the objects in space offers us some clues to continue. In this case the eye recognizes, chooses and pinpoints this or that junction, this or that gap between two objects. Textures, fabrics - the nerves of any material - are taken as bunches, by batches, or families, and then propped against the wall or arranged on the floor. Above all it’s necessary to find the right position. Place, dispose, overlap, counterpoise: different ways of proposing durable balances. The elegance lies therein. They hold together, with precision, in the scale of the flexible possible.
These proposals (let's call them “proposals” for the time being) harbor an alien naturalness.
Where does this alien naturalness come from? It derives from the recognition of a principle of action in each material used, i.e. – paying attention to the timbre of each individual material. They are almost all pre-fabricated, and twisted until they fulfil their strange nature. And don’t forget Duns Scotus’ theory that “nature is always curved“ – it starts at one end and doesn’t end at the other. The artist revolved around each work, returned to it, paying attention to tiny details, adjusting here, trimming over there. Attention dedicated in concentrating circles. Matryoshka-Matrix. The vertical axis secures the circular rhythms:
· For example, a PVC tube which pierces a metal bench, parallel to the washer, in the middle of the tube, surrounding a round curtain of long yellowish strands which hang from the mouth of the tube and almost touch the floor.
· Or two black twirling translucent parasols that spin parallel to one another, about two inches from each other, held together by a taped thread that almost touches the ground.
The delicacy that derives from the acuity of these combinations is due to the fine-tuned precision of this hot-and-cold method. It implies complete dedication to a task that can only be achieved through visionary pragmatism. It involves cooking and sewing, quickly catching long-lasting accidents, cleaning and sweeping to pursue the right random occurrences. An open outlook - because nature is always curved and we don’t know when it will catch us.
have you come
to save us haiku poets?
red dragonfly
Kobayashi Issa